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A constituição de 1988 é o novo alvo do conservadorismo


Publicado: 05/10/2015

Por Marco Mondaini 

O editorial do jornal O Globo de 14 de setembro de 2015 é o exemplo mais perfeito do ponto onde pode chegar o pensamento econômico conservador diante de um cenário de crise como o que estamos vivendo na atualidade. Seu título, por si só, esclarece a filiação neoliberal das ideias defendidas pelo diário de circulação nacional com sede no Rio de Janeiro: “Estado tutor faliu”. A tese central sustentada no texto procura vincular a crise econômica pela qual passa o país não apenas às opções tomadas durante o governo da presidente Dilma Rousseff ou, de maneira mais ampla, ao modo petista de governar iniciado com a Presidência de Lula.

Para O Globo, as raízes da crise estariam localizadas na própria Constituição Federal de 1988, responsável primeira pela implantação, no Brasil, de uma “percepção míope da realidade”, que viria a ser derrubada apenas um ano depois com a queda do Muro de Berlim. Dito de outra maneira, segundo a opinião de O Globo, a “Constituição Cidadã” do ilustre deputado Ulysses Guimarães traria embutida no seu corpo o “modelo da centralização excessiva de tudo pelo Estado”, tal qual a extinta União Socialista Soviética.

Eis, de maneira literal, a opinião oficial do jornal que tem, entre seus colunistas, figuras do jornalismo econômico da estirpe neoliberal de Miriam Leitão e Carlos Alberto Sardenberg: “O aspecto negativo da Carta deriva de uma visão ideológica de mundo por meio da qual ela foi redigida, com o Estado sendo colocado sobre a sociedade, no papel de uma espécie de tutor que concentraria o máximo das rendas da sociedade, extraídas por elevados impostos, com a finalidade de distribuí-las para mitigar a pobreza. O Esta do seria o agente do ‘bem’”.

Primeiramente, é preciso que se diga, a bem da verdade, que a tese conservadora que procura relacionar um possível descalabro econômico ao texto da Constituição Federal de 1988 não tem absolutamente nada de original, pois, à época da sua promulgação, o então presidente José Sarney, já comunicava aos “brasileiros e brasileiras”, num explícito ato de chantagem política, que o país se tornaria completamente ingovernável caso a Assembleia Nacional Constituinte votasse favoravelmente à sua aprovação.

Pois bem, a chantagem neoliberal volta à cena sob nova plumagem, com o discurso de que, sem a realização de profundos cortes orçamentários que apontem para o enxugamento do Estado brasileiro, a situação econômica do país tornar-se-á falimentar, agregando-se como fator de desestabilização à atual crise política que envolve o governo da presidente Dilma Rousseff.

No entanto, há algo de mais perigoso ainda no editorial de O Globo, que expressa a onda de intolerância político-ideológica que toma conta das principais cidades do país, servindo, ao mesmo tempo, de combustível para o crescimento da mesma, num jogo de alimentação e retroalimentação. Falo, aqui, da tentativa de construção de um sentimento de desconfiança e oposição (para dizer o mínimo) em relação àquela que é a Constituição mais democrática de toda a nossa história, a Constituição que marca a nossa entrada na “era dos direitos”.

A Constituição que representa um marco fundamental na longa caminhada do Brasil rumo à edificação de um Estado de Direito compromissado com o bem-estar social. Uma Constituição que, no campo dos direitos sociais, incorpora aquilo que de melhor foi produzido pela tradição social-democrática, à medida em que define a seguridade social como “um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”, com base em três princípios fundamentais: universalidade, descentralização e participação.

Ora, a fim de que a sociedade brasileira consiga alcançar níveis elevados de seguridade social, com a devida efetivação dos direitos sociais, não podemos abrir mão do que está previsto legalmente na Constituição de 1988, da mesma forma que precisaremos da presença de um Estado que atue na expansão e melhoria da qualidade dos serviços e políticas públicas - um Estado que não seja limitado nas suas funções econômicas. Ao contrário do que pensa O Globo.

Marco Mondaini é historiador e professor da UFPE



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