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A reconfiguração da conjuntura favorece Lula


Nem governo e nem ativistas podem baixar a guarda. É preciso aproveitar o momento político favorável para extrair o máximo de dividendos

Publicado: 20/10/2025

Lula por Ricardo Stuckert/PR

Do GGN
Por Aldo Fornazieri

Desde o início de julho, quando o presidente Trump decretou o tarifaço de 50% contra produtos brasileiros e enviou uma carta a Lula com argumentos puramente políticos para justificar as medidas, a conjuntura começou a mudar. A marca da mudança se evidencia no crescimento das avaliações positivas do governo e do desempenho nas simulações eleitorais de Lula e  na queda das negativas.

A mudança da conjuntura se deve a alguns acontecimentos casuais (imprevistos, ação da Fortuna), e outros causais, definidos por ações positivas do governo e do presidente Lula. Os principais eventos casuais se referem à ação anti-Brasil de Eduardo Bolsonaro e dos bolsonaristas, que resultaram no tarifaço e na punição de ministros do STF, particularmente de Alexandre de Moraes.

Esses eventos foram acompanhados por declarações desastrosas de lideranças bolsonaristas no Congresso, a exemplo de Sóstenes Cavalcante, e do governador Tarcísio de Freitas. Ao se posicionar de forma que parecida estar aprovando as ações de Trump, o governador sofreu forte abalo na pretensão de ser candidato a presidente.

O desastre não ficou por aí. A tentativa de aprovar a PEC da blindagem foi o maior presente que o governo Lula recebeu do bolsonarismo, em que pese deputados governistas, incluindo 12 do PT, terem votado na proposta. A reação da opinião pública foi de indignação, resultando nas significativas manifestações de rua em 21 de setembro.

Os protestos, resultantes da indignação contra a PEC, uma circunstância casual em relação ao governo, representaram uma transição para um ambiente de ações causais propiciadoras de mudanças conjunturais favoráveis ao campo governista. O tamanho das manifestações ativou os ânimos para um maior engajamento e ativismo político em favor do governo e de combate ao bolsonarismo e ao Congresso.

Dentre os principais eventos causais está a aprovação do projeto de isenção do imposto de renda. A Câmara dos Deputados, pressionada pela opinião pública, viu-se constrangida em aprovar por unanimidade o projeto. Outros programas sociais, a exemplo do Pé de Meia e de financiamento de imóveis para a casa própria também contribuem para melhorar o humor do eleitorado. Com alto emprego e com sinais de que a inflação parece ceder, a percepção sobre a economia começa a mudar.

Mas no plano político as coisas também mudaram. O tarifaço e o encontro e conversas de Lula com Trump proporcionaram um duplo ganho. De um lado, Lula ganhou por defender a soberania e os interesses do Brasil. Esse discurso agrada mais os setores progressistas. Mas a relação com Trump proporcionou ganhos em outros setores. Os segmentos de centro e setores produtivos viram que Lula e o governo não são obstáculo ao diálogo com o governo norte-americano. A mútua simpatia entre Trump e Lula desarmou o discurso bolsonarista e bloqueou, ao menos em parte, as ações deletérias de Eduardo Bolsonaro contra o Brasil.

Lula passou a se valer de discursos ambivalentes para abordar a complexidade do tema envolvendo tarifaço, soberania e diálogo com Trump. Ao discursar no Rio de Janeiro, na comemoração do Dia dos Professores, na presença de Hugo Motta (presidente da Câmara dos Deputados), e do prefeito Eduardo Paes, Lula declarou que na conversa com Trump “não pintou uma química, mas uma indústria petroquímica”. Já, em São Bernardo do Campo, ao discursar para estudantes secundaristas, disse que “nunca mais um presidente de outro país ouse falar grosso com o Brasil”.

Uma das principais qualidades que o bom orador deve ter, consiste em adaptar a linguagem conforme o público. Lula não pode usar a mesma linguagem usada num encontro de estudantes quando fala a uma plateia de empresários. Os discursos ambivalentes não expressam uma conciliação ou confusão. Devem ser diferentes aspectos de uma estratégia discursiva que tem objetivos e metas a alcançar.

Nos últimos tempos, o governo calibrou melhor a comunicação e Lula calibrou melhor seus discursos. Lula está mais onde nunca deveria ter se afastado: junto ao povo, aos movimentos sociais. Esses movimentos fortalecem a popularidade de Lula, o que o faz contrabalançar melhor o poder em relação ao Congresso.

Não por acaso, na última semana o governo demitiu aliados de deputados que votaram contra a Medida Provisória 1303, que provisionava recursos para equilibrar as contas públicas. Quanto mais o governo melhorar o seu desempenho na avaliação popular e quanto mais Lula melhorar sua avaliação e sua liderança nas pesquisas, mais força terá para contrabalançar o poder em relação ao Congresso. Aumentará seu poder para conter a oposição e para atrair aliados.

Pela primeira vez desde o início do terceiro mandato de Lula, o campo governista está na ofensiva política, com uma maior ocupação das ruas e das redes sociais. O tarifaço e a PEC da blindagem colocaram o bolsonarismo e setores do centrão na defensiva política e moral. O tarifaço coloca os bolsonaristas sob a bandeira da traição ao Brasil. A PEC os empurra para a condição de albergadores de interesses do crime organizado. Com isso, a proposta da anistia aos golpistas também entrou na defensiva e tende a não prosperar.

Esses avanços nas avaliações do governo e de Lula e o crescimento do ativismo político, no entanto, ainda não configuraram uma conjuntura de tranquilidade e não indicam, ainda, um cenário que se possa dizer que a batalha de 2026 será vencida. As avaliações negativas do governo e de Lula ainda são maiores do que as positivas. Essas curvas precisam mudar.

Apesar de cambaleante, o bolsonarismo não está morto. Mantém uma considerável força política e eleitoral. O segundo turno das eleições presidenciais de 2026 tende a ser altamente polarizado. Nem o governo e nem os ativistas podem baixar a guarda. É preciso aproveitar o momento político favorável para extrair o máximo de dividendos.

Para continuar melhorando o desempenho do governo e de Lula é necessário enfrentar e superar alguns desafios. No plano externo, as negociações com o governo americano precisam alcançar alguns êxitos relativos às tarifas, à suspensão das punições a membros do STF, à exploração das terras raras, à regulamentação das big tech. As investidas americanas contra a Venezuela e a Colômbia também precisam entrar na mesa das negociações, com uma clara posição do Brasil contra intervenções militares. Na COP30, o Brasil precisa reafirmar sua liderança e protagonismo na luta ambiental, com proposições efetivas no enfrentamento dos problemas globais.

No Congresso, o governo tem alguns desafios importantes, com destaque para a busca de uma saída para o buraco fiscal, a PEC da Segurança Pública, o PL dos cortes dos incentivos fiscais, a reforma da previdência dos militares, o PL dos cortes dos supersalários, a Escala 6×1 e a regulamentação das big tech e da IA. O governo precisa, ao menos, de êxitos parciais importantes nessa agenda. Tudo somado, O governo e Lula precisam continuar aumentando as suas avaliações positivas e reduzindo as negativas. Manter-se na ofensiva e estimular o ativismo e a mobilização das bases sociais são condições

Aldo Fornazieri é professor da Escola de Sociologia e Política e autor de Liderança e Poder



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