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Emendas impositivas desmontam conceito de presidencialismo, diz especialista


Audiência pública convocada pelo ministro Flávio Dino nesta sexta-feira (27) discute legalidade das emendas

Publicado: 27/06/2025
Escrito por: ICL Notícias

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, convocou uma audiência pública para esta sexta-feira (27), com o objetivo de discutir as emendas parlamentares, tema que está no centro da queda de braço entre Congresso e Supremo. A audiência não vai tratar apenas de temas mais imediatos, como a necessidade de que a distribuição do dinheiro público siga regras claras e transparentes e que o destino da verba seja sempre rastreável. A sessão também vai discutir a legalidade das emendas.

Márcia Semer, doutora em direito público e procuradora aposentada, vai representar a Associação de Advogadas e Advogados Públicos para a Democracia (ADP). Ela acredita que Dino tem diante de si uma decisão juridicamente muito simples e óbvia, mas politicamente bastante difícil: acabar com as emendas impositivas.

Ela adiantou ao ICL Notícias as reflexões e dados históricos que apresentará durante a audiência. Para Márcia Semer, essas emendas ferem princípios básicos do sistema político brasileiro e a soberania da população.

“O único elemento da constituição da República que foi diretamente decidido pelo povo, soberanamente, no plebiscito de 1993, foi a escolha do sistema de governo presidencialista. Mas as emendas impositivas vieram para desmontar a ideia, o conceito de presidencialismo.”

Márcia Semer defende que juridicamente, como o sistema de governo foi decidido pelo povo, por voto direto, ele não pode ser modificado. Mas, argumenta, a administração de uma boa parte do orçamento federal por parte do Congresso Nacional subverte a lógica do sistema. No presidencialismo, cabe ao executivo gerir o orçamento federal e ao legislativo fiscalizar a execução. Com um volume de emendas cada vez maior nas mãos do parlamento, quem executa cada vez mais o orçamento são os deputados e senadores.

Essa prática torna o presidencialismo brasileiro cada vez mais parecido com uma espécie de parlamentarismo orçamentário. Um modelo que a distorção política brasileira fez nascer. Mas a movimentação nessa direção não começou ontem.

Emendas surgiram em momentos de crise

Márcia Semer mergulhou na história para entender como tudo isso aconteceu. Ela conta que a primeira vez em que se falou de emenda parlamentar impositiva, ou seja, de passar a execução de parte do orçamento federal para as mãos do congresso, foi no ano 2000. Uma proposta do então deputado Antônio Carlos Magalhães.

“Era um momento de fraqueza política do presidente. A maior crise do governo Fernando Henrique Cardoso. A emenda não foi votada, mas ela ressurgiu na crise do mensalão, em 2006. O presidente Lula foi reeleito e a medida não vingou. Quando ela aparece novamente? Em agosto de 2013!”, diz Márcia.

O mês de julho de 2013 foi marcado por uma série de protestos que provocaram a queda de popularidade da presidenta Dilma Rousseff. Justamente nessa hora, a proposta das emendas voltou ao debate. Em 2015, pela primeira vez foi aprovada a Emenda Constitucional 86 que obriga o governo a executar emendas individuais dos parlamentares. Ou seja, diz Márcia Semer, nos momentos de fraqueza do executivo, o legislativo tentou recorrentemente se assenhorar do orçamento federal.

Ao analisar cuidadosamente a composição da Assembléia Nacional Constituinte, eleita para elaborar a constituição da república quando terminou a ditadura militar, Márcia notou que os políticos mais influentes, durante e depois de aprovada a constituição, em 1988, eram todos parlamentaristas. Mas não conseguiram aprovar o sistema de governo no voto popular, no plebiscito.

Eles foram derrotados, mas não se deram por vencidos. Sempre que perceberam fragilidades na Presidência da República, voltaram à carga para aproximar o sistema político do projeto que não conseguiram aprovar nas urnas. Até a vitória de 2015.

De lá para cá, o problema só aumentou porque a fatia do orçamento executada pelo Congresso cresceu com os anos. E dá aos parlamentares as ferramentas para se perpetuar no poder. O que fere um segundo pilar da constituição, segundo a especialista: o princípio da impessoalidade. A ideia de que governo algum é dono do estado. Por isso, era proibido ao governo federal propagandear obras e dizer que eram iniciativa deste ou daquele governante e sim, do governo federal, sem nomes.

Mas a pulverização do orçamento e a distribuição da verba acabaram com isso porque os deputados e senadores usam o dinheiro em seus estados e municípios de forma que os eleitores saibam exatamente quem enviou o recurso para uma obra ou a compra de um equipamento. Isso dá, a quem já está no poder, uma enorme vantagem para se perpetuar no poder. O que acaba com o princípio da impessoalidade.

“Eu achei que demorou muito até alguém questionar a constitucionalidade do mérito dessas emendas”, disse Márcia Semer. Desde o ano passado o ministro Flávio Dino trava uma queda de braço com o Congresso a respeito da transparência e da rastreabilidade das emendas parlamentares. Agora, o PSOL e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) apresentaram ao STF ações diretas de inconstitucionalidade alegando que as emendas alteraram o regimento orçamentário nacional e ferem o presidencialismo.

O assunto será o tema da audiência pública, convocada pelo ministro Dino, que recebeu 40 pedidos de habilitação de expositores. Eles tiveram que comprovar experiência adequada para se qualificar. Foram convidados representantes da sociedade civil, do mercado financeiro, professores de finanças públicas, juristas, parlamentares, especialistas em direito financeiro, entre outros.

A audiência começa às 9 horas desta sexta-feira (27). As exposições foram divididas em três blocos e terminam às 17 horas, com transmissão pela TV Justiça.



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