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“Os indígenas do Brasil são esquecidos e desprezados pelos governos”


Entrevista com João Manoel de Oliveira, líder indígena na Aldeia Brejo dos Padres do Povo Pankararu, conhecida também como João Pankararu

Publicado: 19/04/2018
Escrito por: Ascom Sindsep-PE

EM TODO O BRASIL, NO DIA 19 DE ABRIL É CELEBRADO O DIA DO ÍNDIO. UMA DATA MUITO MAIS FESTIVA QUE POLÍTICA. PARA JOÃO MANOEL DE OLIVEIRA, MAIS CONHECIDO COMO JOÃO PANKARARU - DA ALDEIA BREJO DOS PADRES DO POVO PANKARARU, EM TACARATU, NO SERTÃO DE PERNAMBUCO – NÃO HÁ MUITO O QUE COMEMORAR. SERVIDOR DA FUNAI DESDE 1985, JOÃO TEM UMA RAÍZ ETNICA FORTE: É SOBRINHO DO CACIQUE JOÃO MONTEIRO DA LUZ, TAMBÉM CONHECIDO POR JOÃO BINGA, DE QUITÉRIA BINGA E MIGUEL BINGA, ANTIGAS LIDERANÇAS QUE DEIXARAM UM GRANDE LEGADO PARA O POVO PANKARARU. NA ENTREVISRA A SEGUIR, JOÃO RECLAMA DO DESCASO DO PODER PÚBLICO EM RELAÇÃO AOS POVOS INDÍGENAS E DAS DIFICULDADES ENFRENTADAS POR ELES.

GARRA – Está chegando mais um 19 de abril, Dia do Índio. Os povos indígenas têm motivo para comemorar esta data?
JOÃO PANKARARU – Primeiro, essa data foi imposta a nós sem sermos consultados. Para os povos indígenas, não há muito para comemorar (a não ser pelos nossos rituais sagrados, nossa existência), pelo fato de todos os dias serem dias de luta, de resistência para garantir nossos direitos, como por exemplo nossos territórios demarcados, homologados e desintrusados. O termo “índio” também não nos cabe, uma vez que este termo tem mais a ver com um erro de Pedro Álvares Cabral quando pensou que tinha chegado à Índia, por isso, indígena é mais condizente com a realidade. No momento, nossas terras não estão em nossas mãos, ou seja, regularizadas como determina a Constituição Federal de 1988. Ainda hoje, estamos com elas ocupadas por posseiros, grileiros, grandes empresários, fazendeiros, políticos, entre outros. Gostaríamos que a Constituição fosse cumprida. 


GARRA – Qual o principal problema enfrentado, hoje, pelos povos indígenas?
 JOÃO PANKARARU – Entre muitos, o maior problema que enfrentamos é a intrusão dos não índios em nossas terras. Há mais de 50 anos o povo Pankararu vem tentando, junto à Justiça, a retirada dessas pessoas (os não índios) da nossa terra, mas até o momento isso não aconteceu. Constantemente, temos que lidar com uma bancada política desfavorável aos povos indígenas, que tenta a todo instante, incansavelmente, votar CPIs, PLs, PECs etc, contra os índios. Tentam acabar com os poucos direitos que conseguimos conquistar com muita luta, muito sangue derramado.


GARRA – Muita gente não sabe como vivem os índios brasileiros, vê o índio como algo exótico. As escolas tratam o dia 19 como algo festivo, dificilmente discutem a história e a condição dos povos indígenas na atualidade. Qual a realidade vivenciada pelos índios brasileiros e, em especial, os de Pernambuco.
 JOÃO PANKARARU – Os indígenas do Brasil são esquecidos e desprezados pelos governos, que não procuraram regularizar a situação fundiária e social. Ao nosso entender, não avançou em nada desde a Constituinte. Os governantes não dão importância à questão indígena em geral, tanto na questão fundiária como na questão social. Em todo o estado de Pernambuco, somos 14 povos indígenas, com uma população aproximada de 45 mil pessoas e até o momento apenas um desses povos está com a situação fundiária regularizada, o Povo Xukuru do Ororubá, no município de Pesqueira, Agreste pernambucano. 


GARRA – Quanto à identidade étnico-cultural dos povos indígenas, você considera que ela vem sendo alterada a partir do crescimento das cidades e do avanço tecnológico? 
JOÃO PANKARARU – No meu ponto de vista é um ponto positivo, pois alguns indígenas que viviam apenas na comunidade, viviam isolados. Após o acesso às grandes cidades ou circunvizinhas tomaram conhecimento como as coisas acontecem a partir de um outro olhar. Foi a partir daí que aprendemos outras formas de viver e de nos defender, usando com sabedoria aquilo que representa uma ameaça para muitos. Mesmo havendo uma adaptação às novas tecnologias, eu acredito que os indígenas mantêm a identidade etino-cultural e por isso não são totalmente adaptados à vida na cidade grande, pois nos períodos de nossas tradições eles estão presentes nos rituais, coisa que numa cidade grande não se tem. A vida na cidade grande nos dá oportunidades que a vida somente na área indígena não dá, mas não é por isso que nossa identidade cultural é diminuída ou perdida. A cada retorno ao nosso Povo esse sentimento de pertencimento cultural é reforçado e fortalecido ao reencontrar os familiares e, principalmente, ao participar dos rituais tradicionais.

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